Vénus

As asas estão a crescer!
Aprendo os recantos multicolores das penas,
a aerodinâmica necessária para poderem ser
nas noites amenas de pratas Luas
que avisto das minhas janelas.
Rasgam os músculos presos às omoplatas,
grito com as dores esfuziantes que me provocam,
mas ainda não sei o que fazer delas.
E assim choram a pedirem-me a responsabilidade
que ainda não tenho para as cuidar,
mas só porque não tenho nada para lhes dar.
No meio estou,
Talvez, sempre estarei.
Mas hoje, quando mais apertam,
por baixo da camisa que uso,
a contraírem-se por mais espaço,
encontro a estrela da manhã,
quando devia encontrar a lua.
O início do amanhecer carrega um caleidoscópio,
o fim da tarde também,
mas o pôr-do-sol ainda é cedo
para as criaturas da noite.
O ar é diferente na madrugada,
entra em mim sem permissão.
A relva molhada dos aspersores
refresca os pés quentes do calor da terra.
A arquitectura do mundo ergue-se para mais um dia,
e estou numa primeira fila, a receber um segredo impartilhável,
enquanto o céu se abre para mim.
No caminho intransponível que vejo além rio,
as asas são, e guiam-me à estrela da manhã.
Enquanto os meus pés se transformam em patas e garras afiadas,
revelam-me ao ouvido o segredo da gárgula do fim,
a beijar a estrela do início à espera do sol,
para depois se poder recolher e despedir,
Vénus, até à próxima madrugada!